Nicaragua volta aos mapas

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[ANÁLISE]
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Nicaragua volta aos mapas

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por Oscar Valadares | [fusion_fontawesome icon=”fa-twitter fab” size=”” flip=”” rotate=”” spin=”no” alignment=”” hide_on_mobile=”small-visibility,medium-visibility,large-visibility” class=”” id=”” margin_top=”” margin_right=”” margin_bottom=”” margin_left=”” circle=”no” iconcolor=”#03a9f4″ circlecolor=”” circlebordercolor=”” animation_type=”” animation_direction=”down” animation_speed=”0.1″ animation_offset=””][/fusion_fontawesome]

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Até há meio ano, aproximadamente, a Nicarágua era, para sociedades como a nossa, a milhares de quilómetros, o perfeito exemplo de país que apenas existe nos mapas. A maioria pouco mais sabe dele do que o nome da capital — e nem sempre — e poucas pessoas são capazes de o situar corretamente num mapa mudo, entre outros Estados semelhantes que, com a mesma língua, pareceriam estar aí simplesmente a bem dos números macro da língua castelhana. Mesmo para o internacionalismo, a Nicarágua representava pouco mais do que a lembrança feliz de uma revolução vitoriosa e a consciência de que os grandes poderes transnacionais estão dispostos a qualquer cousa — contras inclusive — com tal de conservar a sua quota de mando e os seus lucros previstos. Mas aquele triunfo tinha passado nos finais da década de setenta, e outras causas mais recentes foram ocupando o espaço reservado à solidariedade ao passo que o quintal traseiro dos Estados Unidos se alargava interminavelmente em todas as direções, com especial dureza na última década para o mundo árabe e muçulmano. Contudo, em meio a essa ignorância mútua, da noite para o dia, os grandes médios globais começaram a falar da Nicarágua todos os dias, mesmo várias vezes por dia, e a fazê-lo nos mesmos termos que levam anos a empregar para falarem da demonizada Venezuela, antes com Hugo Chávez, agora com Nicolás Maduro. Foi aí que muita gente ficou a saber que o governo de Manágua se tinha convertido em “regime” — o que é substancialmente diferente, mas ninguém sabe explicar por que nem a partir de que momento — e que a única solução para todos os problemas era que Daniel Ortega, o presidente reeleito em 2016 com a sua maior margem de sempre, se demitisse e deixasse passo a um novo governo.

De repente, os problemas — os que existiam — apareciam sobredimensionados. Os que não existiam, também. A informação de contexto gritava pola sua ausência. Os médios menos aventureiros argumentaram que o esgotamento do modelo sandinista parecia ter sobrepasado uma linha vermelha. Ninguém dizia exatamente qual. Alguns outros, como de costume, chamavam ao derrubamento do “ditador” através dos seus editoriais ou dando espaço a quem dizia representar a população, como mais um membro, e que costumava aparecer de cara tapada ou anonimizado através das fórmulas mais diversas: a manifestante, o vizinho, a estudante. Também lhe foi dado espaço à igreja, outrora uma das forças que mais ferozmente se opôs à Revolução Sandinista, e à oligarquia financeira, que também não sente grandes simpatias pola FSLN, como é fácil deduzir. Todos, a igreja e os grandes capitalistas do país, correram para aparecer como intermediários de umas conversas entre o governo e a oposição, embora serem eles mesmas parte da oposição. Mas ninguém queria falar disso porque o que se via nas ruas eram estudantes, mocidade, “povo”. O mesmo que na Venezuela apenas uns meses antes. E, mesmo assim, poucos relacionaram os cenários. O que acontecia, então?

A pobreza, um dos indicadores de referência, caiu quase pola metade nesse período: de 48% para 25% (dados do BM), e o PIB aumentou em 38%

Não faz sentido fazer aqui uma reprodução dos enfrentamentos e das negociações, nem sequer resumida. Em troca, se retirarmos os olhos um momento da Nicarágua, o que fica à vista são determinados padrões de atuação que apontam numa direção muito determinada: que a crise dos meses centrais de 2018 não pode ser entendida apenas de dentro do país, e que convém procurar fora dele para entender o que aconteceu em toda a sua complexidade. Também se tem dito que, afinal, são as pequenas iscas as que incendeiam a pradaria, e que no caso da Nicarágua, a indignação polo incêndio da reserva tropical de Indio Maíz e a proposta de reforma das pensões se uniu ao que os meios chamaram “o esgotamento do modelo sandinista” para acabar estourando em Abril de 2018. Mas, qual esgotamento? O esgotamento, no caso de existir, poderia ter-se argumentado em 1990, quando de facto a FSLN perdeu as eleições e o governo passou para um grupo de governantes corrupto e neoliberal que desfez, quando menos em parte, algumas das grandes vitórias revolucionárias. Ainda assim, a FSLN ainda perdeu mais duas eleições, em 1996 e 2001, e só conseguiu voltar ao governo em 2006, com 38% do voto e nove pontos por diante do segundo. Em 2011, a percentagem da FSLN subiu para 62%, e em 2016 para 71%. As políticas que explicam tais resultados incluem reformas destinadas à melhora da educação, crédito e segurança social. A pobreza, um dos indicadores de referência, caiu quase pola metade nesse período: de 48% para 25% (dados do BM), e o PIB aumentou em 38%. O país mesmo recebeu os elogios das Nações Unidas pola sua baixa taxa de criminalidade e pola sua política de policiamento comunitário. Não são maus dados, mas foram rapidamente esquecidos. No entanto, em 2014, a FSLN aboliu a lei de limite de mandatos, o que foi apresentado pola imprensa internacional como evidência de que Ortega se estava a converter em ditador. Mas tampouco isso disparou os protestos. Depois vieram as eleições de 2016 e o resultado foi eloquente. Na realidade, muitos países considerados plenamente democráticos carecem desse tipo de leis de limite — na Europa, apenas há limitações em Portugal, França, Letónia, Lituânia, Roménia e os restos da antiga Jugoslávia. Mas o que tampouco têm esses países são tratos muito amigáveis com governos que levam anos na diana do imperialismo — como Cuba, Venezuela ou Bolívia, com os que o sandinismo tem chegado a acordos preferenciais — ou com Estados que apostam em estratégias para um mundo multipolar que limita o poder do Atlântico Norte e do capital transnacional, como a ALBA-TCP ou os BRICS.

Evidentemente havia problemas internos, aliás graves, que explicam as primeiras mobilizações contra o governo em Abril. O que não explicam assim tão claramente é a vertiginosa escalada do conflito. Em primeiro lugar, quem defendia os manifestantes, dizia que tudo tinha começado pola passividade do governo a intervir num incêndio numa reserva tropical. Sem dúvida, não foi um problema menor. Tratava-se, antes bem, da maior catástrofe ambiental da história do país, concitando importantes protestos, sobretudo nos campos — nesse divórcio entre o campo e a cidade que oculta outras cousas, e que na Nicarágua se vive como no resto de países da região. O seguinte, segundo informaram os médios, foi que o governo apresentou uma reforma das pensões que as cortava em 5% em troca de melhoras na atenção médica, e que aumentava a carga nos salários dos impostos dedicados ao sistema de previdência social, tanto para empregados como para empregadores. Havia motivos para o descontentamento? Havia, mas não para iniciar uma revolta com armas na mão e técnicas de guerrilha urbana, como de facto aconteceu. Sobretudo porque o governo sandinista retirou a proposta vários meses antes de que pudesse sequer ter entrado em vigor. Ademais, quando, em Abril de 2018, começaram os protestos violentos, não foram as comunidades dependentes da selva nem os aposentados, mas os estudantes, que se lançaram a construir barricadas nas ruas e nas estradas e a exigir a demissão do presidente, provocando a resposta policial, que foi errática e desmesurada. Por que os estudantes?

O modelo de estudantes que paralisam um país não é novo. Foi já empregue na Jugoslávia, na Ucrânia, na Tunísia, no Egito, na Síria e mesmo na Turquia, com bons resultados, quase sempre

Analisemos isto brevemente: o modelo de estudantes que paralisam um país não é novo. Foi já empregue na Jugoslávia, na Ucrânia, na Tunísia, no Egito, na Síria e mesmo na Turquia, com bons resultados, quase sempre. O que têm em comum todos estes países é terem sido alvo das chamadas “revoluções coloridas” ou de intentos de levá-las para a frente, que, na realidade e sob diferentes nomes mais ou menos grandiloquentes, não são outra cousa que operações de ingerência externa branda usadas polos Estados Unidos desde o fim da Guerra Fria para derrubar governos incómodos sem recorrer à ação direta inicial. Enfrentar estudantes — facilmente beneficiários da empatia da opinião pública — com a polícia, procurando uma resposta desproporcionada para ser vista e reproduzida a toda a hora pola imprensa internacional; insistir até à náusea no mantra inverosímil dos protestos sempre pacíficos para deslocar a responsabilidade pola violência para o lado do governo; apresentar todas as vítimas como pertencentes ao bando “popular” e desprezar as vítimas policiais; ocultar a destruição da propriedade pública e privada (atentados contra várias câmaras municipais e residências particulares de militantes da FSLN); focar-se exclusivamente num ponto geográfico concreto e de alto valor simbólico (no caso da Nicarágua, o bairro de Monimbó) para fazer ver que o resto do país está na mesma situação; ocultar o papel da enfraquecida oposição política, apresentando-a como simples observadora de um “processo popular”; caricaturizar o governo como “regime” e acasalar-lhe quanto for despótico e cruel; apelar à “comunidade internacional” para exigir ao Estado o cumprimento da sua “responsabilidade de proteger” — estas e outras técnicas do estilo, centradas na guerra mediática e que temos visto tão claramente nas guarimbas venezuelanas em 2017 ou nas primaveras árabes durante 2011, estão todas contidas num manual bem ensaiado que tem um único objetivo: apresentar a crise como resultado de umas condições internas insustentáveis que racham de repente, quando menos se espera e por onde menos se conta, e criar um caos aparente e uma total deslegitimação das estruturas do Estado que facilite aos olhos da opinião pública local e internacional uma intervenção estrangeira para restaurar a ordem, quer através de instituições supranacionais cooptadas polo imperialismo — caso da Organização de Estados Americanos no exemplo da Nicarágua e no da Venezuela; mas também da Liga Árabe em relação à Síria e à Líbia, etc. — ou, no pior dos cenários, intervindo diretamente boots on ground.

Este tipo de guerras brandas, onde os resultados se conseguem com treinamento e financiamento de substitutos (proxies) não convencionais através de ONGs e outras instituições também não convencionais (NED, IRI, OPI, etc.); que têm uma enorme carga do elemento mediático; que não empregam trincheiras nem armamento sofisticado, mas que atacam as bases de legitimação do poder e que transformam qualquer governo numa carauta grotesca de si próprio que todas e todos estaríamos de acordo em derrubar, ou que nós próprios ajudaríamos a derrubar, estão a demonstrar ser enormemente produtivas para o grande poder que vive nas ribeiras do Atlântico Norte. Fano porque são capazes de aproveitar os problemas inevitáveis de qualquer sociedade e também o rechaço natural às mudanças de profundidade e às vias alternativas com o fim de exortar as respostas violentas. Mas também porque a opinião pública mundial, incluída a da esquerda política, se demonstrou completamente refém das aparências e à luz de qualquer abuso ou inconsistência desses processos revolucionários — que de certo os há e é até inevitável — está disposta a deixar cair aliados ou, mesmo, a ajudar a derrubá-los. Por isso a esquerda sistémica apoiou os bombardeamentos da Líbia e da Jugoslávia. Por isso opinou que era melhor que Maduro se retirasse sem importar os resultados eleitorais nem a ausência de qualquer programa da oposição além de simplesmente tombar o governo — do mesmo modo que na Nicarágua, por sinal. E, por isso jogou a carta do paternalismo, sobretudo desde a Europa, para dizer que Ortega se tinha que demitir e a FSLN abandonar o poder. Esse é o tipo de soluções que nos vêm à cabeça quando ignoramos a posição geoestratégica do país ou o histórico fustigamento da América do Norte contra a integração centro-americana, da que a Nicarágua é peça essencial. E também por isso, a solidariedade se tem revelado como um vector essencial além da retórica. Foi o apoio de Estados aliados o que permitiu o governo bolivariano de Caracas resistir até que as pressões internas esbanjaram por si próprias a aliança inverosímil da oposição venezuelana. E o mesmo aconteceu na Nicarágua, apoiado precisamente na Venezuela, em Cuba e na Bolívia, essencialmente.

Que a simples resistência no tempo — mesmo que apenas seja para poder identificar os elementos mercenários que também estão presentes em todas as crises deste tipo e proceder à sua expulsão ou julgamento —, combinada com os programas de reconciliação, como o que leva para a frente a Síria, sejam capazes de acalmar os ânimos de setores que noutro momento teriam assistido ao linchamento público dos seus governos evidencia duas cousas: primeiro, o quanto de fabricados e irreais são estes conflitos e até que ponto é que estão ligados às agendas de interesses estrangeiras; segundo, o quanto são dependentes da crise do jornalismo e da crise de identidade da esquerda sistémica, incapaz de quebrar a lógica da guerra mediática ou de oferecer alternativas. Depois de meses no foco, Nicarágua transita agora para a normalidade, num processo que há ser longo e complexo. Mas o perigo ainda existe, e as revoluções coloridas não são a única via pola que se manifesta o poder brando. Há quem diga que a América latina está a girar para abandonar a década progressista que viveram alguns dos seus países. O que de verdade acontece é que está a ser girada. Mas na Nicarágua, por enquanto, não o conseguiram, e por isso não é notícia. Que volte ser apenas uma referência no mapa, não é mau sintoma.

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Oscar Valadares é analista internacional OSINT e portavoz naci0nal de Mar de Lumes.

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